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Julgamento no STF: Criminalização do não recolhimento do ICMS

Ineficiência tributária estatal não pode ser corrigida mediante criação de um temor de origem penal

Por Oksandro Gonçalves*| 13/12/2019

O STF (Supremo Tribunal Federal) está julgando uma matéria de extrema relevância: a criminalização do inadimplemento do ICMS. Há muito tempo discute-se se o inadimplemento de uma obrigação tributária caracteriza ilícito ou não.

O STJ (Superior Tribunal de Justiça) chegou a editar a Súmula 430, a qual estabelece que a simples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, a responsabilidade subsidiária do sócio. Entretanto, essa discussão refere-se unicamente ao aspecto da responsabilidade patrimonial que o inadimplemento pode ensejar em face dos sócios da sociedade inadimplente.

Essa súmula foi durante algum tempo um indicativo poderoso em favor da separação do patrimônio da sociedade do patrimônio dos sócios, fazendo com que o Fisco tivesse que demonstrar uma ilegalidade relacionada ao inadimplemento.

Com efeito, o inadimplemento declarado não significa um ato ilícito per si, porque uma crise econômica pode levar ao não pagamento, o que não significa necessariamente uma conduta doloso do contribuinte.

Entretanto, também há muito tempo o Fisco em todas as suas esferas está trabalhando para aperfeiçoar o sistema de cobrança dos tributos que é, notoriamente, caro e ineficiente, como indicam os números da pesquisa do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O levantamento aborda o Poder Judiciário e demonstra a morosidade e como os processos de execução fiscal contribuem para piorar a qualidade da prestação jurisdicional ao usarem em excesso a estrutura judiciária.

Nessa linha, podemos destacar a legislação que previu a possibilidade do protesto da certidão de dívida ativa, um ponto adicional em desfavor do contribuinte e que tem sido usado como mecanismo de cobrança por pressionar o contribuinte com a negativação do seu cadastro perante o mercado.

Portanto, não surpreende a alteração do posicionamento, inicialmente do STJ, que, ao negar o HC n. 399.109, admitiu a prisão por dívida de ICMS declarado e não pago. Na sequência, o STF passou a apreciar o RHC n. 163.334 e os primeiros votos foram em favor da prisão.

Trata-se de uma grande modificação da política penal tributária, que virá associada a outra modificação que temos verificado ultimamente, o fato de o MP dos Estados ingressar com ações penais concomitantemente ao ajuizamento de execuções fiscais pela Fazenda Pública.

A discussão, em nosso modo de ver, não está sendo vista de forma sistematizada, porque não se está articulando essa nova posição com os demais instrumentos em favor do Estado para cobrar as dívidas fiscais.

Atualmente o Estado já goza de uma série de medidas coercitivas privilegiadas em relação a outros tipos de credores. A ineficiência tributária estatal não pode ser corrigida mediante a criação de um temor de origem penal, a última esfera do direito.

Somado a isso, há o fato de que muitos Estados concedem incentivos fiscais que aumentam a diferença entre concorrentes de pequeno porte em relação aos de maior porte, geralmente os que conseguem ser agraciados com esses incentivos.

Dessa forma, há um desvio concorrencial importante que também é responsável por levar ao inadimplemento. Assim, contribuiria mais para a discussão se os Estados tornassem o sistema tributário mais eficiente, simples e seguro, permitindo o adimplemento regular dos tributos, do que lançar sobre todos os contribuintes o temor da prisão em caso de inadimplemento fiscal.

*Advogado Oksandro Gonçalves, consultor jurídico da Afrebras