No Executivo, a maior parte do tempo da equipe econômica responsável pelos temas tributários é investido nas ações emergenciais. No Congresso, o cancelamento das sessões presenciais, segundo parlamentares e assessores legislativos, travou o avanço da pauta na Comissão Mista.

“A pauta foi muito atropelada e o foco agora é sobre a discussão fiscal, teto de gastos, questões ligadas ao federalismo. Depois teremos as eleições. Já se fala muito nos bastidores em tentar uma aprovação até dezembro na Comissão Mista. Mas só um milagre para a votação da Reforma Tributária no plenário ainda em 2020”, afirmou ao JOTA uma assessora parlamentar.

Nas reuniões internas do Governo, o assunto da Reforma Tributária “esfriou” em relação ao período pré-pandemia. “No Executivo, passamos a discutir outros assuntos, como diferimento de tributos, prorrogação ou concessão de novos incentivos fiscais, pautas mais urgentes tomaram conta da nossa agenda”, afirmou ao JOTA Vanessa Rahal Canado, assessora especial do ministro da Economia, Paulo Guedes.

Ela afirma que não é possível assegurar se a Reforma Tributária já estaria aprovada sem a pandemia causada pela covid-19. Entretanto, a assessora especial avalia que mesmo com a agenda tomada pelas discussões emergenciais de combate à crise, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP), relator na Comissão Mista, manteve conversas com estados e setores econômicos.

“Nós também continuamos com essas conversas com estados, setores econômicos e municípios”, explicou. Contudo, Canado disse que as ações tributárias como diferimento de tributos, prorrogação de isenções fiscais, entre outras, ganharam ainda mais espaço na agenda interna.

Atualmente, há três principais propostas de reforma tributária: a PEC 110/2019, que extingue nove tributos -IPI, IOF, PIS, Pasep, Cofins, CIDE-Combustíveis, Salário-Educação, ICMS e ISS- e cria o Imposto sobre bens e serviços (IBS); a PEC 45/2019, que unifica PIS, Cofins, ICMS, ISS e IPI em um único imposto; e a proposta do governo, por meio do Projeto de Lei 3.887/2020, que prevê a criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS) em substituição ao PIS e à Cofins.

Parlamentares

Apesar da análise de falta de possibilidade para a votação no plenário, o tema ainda é dividido entre parlamentares. Parte dos membros acredita que o país precisa aprovar a Reforma Tributária, de forma completa, ainda em 2020 para dar um sinal ao mercado sobre a possibilidade da volta do crescimento econômico.

Por outro lado, há parlamentares com receio de que a “correria” para a aprovação até dezembro possa fazer com que o modelo final da reforma tributária esteja longe do ideal e atrapalhe, em vez de ajudar, setores específicos da economia.

“A meu ver, a reforma tributária precisa ser feita não para resolver um problema imediato, apesar de a questão ser urgente, mas para médio e longo prazo, de forma planejada e paulatina. Precisa ser debatida e votada agora, mas com resultados que valham mais para frente, de forma que todos os atores e agentes tenham condições de se adaptar”, afirmou ao JOTA o senador Antonio Anastasia (PSD/MG).

Para ele, o assunto por si só já é complexo, mas com a pandemia a discussão ficou ainda mais difícil. “Isso soma-se ao momento grave da economia que vivemos, com a baixa na movimentação dos negócios e a necessidade de aumento dos gastos públicos”, afirmou o senador.

Questionado sobre as principais dificuldades que o Congresso enfrenta para a discussão da Reforma Tributária, Anastasia explicou que interesses da União, dos estados e dos municípios; questões entre estados mais ou menos industrializados, mais ou menos exportadores e o conflito entre setores da indústria, do comércio, dos serviços e do agronegócio são os assuntos mais complicados. “Não é um debate simples”, afirmou.

Um dos precursores da Reforma Tributária e autor da PEC 110/2019, o ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly acredita que ainda existe ambiente para a votação total da reforma até dezembro. Isso porque, avalia Hauly, apesar da falta das discussões presenciais no Congresso, o tema da Reforma Tributária já foi amplamente debatido e bastante socializado com a população. “Isso nunca tinha acontecido com as propostas do passado”, afirmou.

Ele destaca que o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM/AP), está em fim de mandato presidencial da Casa e, por isso, quer deixar como legado a aprovação da reforma tributária, juntamente com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ).

“Já na Comissão Mista, os parlamentares querem a segurança de que duas PECs [45/2019 e 110/2019] estarão juntas, com o que tem de melhor em cada uma. E é isso que o relator, deputado Aguinaldo Ribeiro, deve fazer”, afirmou Hauly.

Segundo Bruno Teixeira, tributarista do TozziniFreire Advogados, a principal desvantagem de não votar a reforma tributária em 2020 é política. Isso porque o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, um dos parlamentares que mais defende a urgência de uma reforma no sistema tributário, termina seu mandato como presidente em janeiro de 2021. Maia é visto, avalia Teixeira, como um dos principais articuladores a favor da reforma, e não votar o dispositivo ainda em 2020 significaria perder um parlamentar, no comando da Casa, protagonista no debate.

“Teríamos que ter um novo presidente da Câmara tão disposto quanto o Rodrigo Maia para seguir com a votação. A gente não vê esse mesmo protagonismo, por exemplo, por parte do presidente do Senado”, afirmou o tributarista.